terça-feira, 14 de abril de 2009

Ato de resistência, por Marcos Alves

Marcos Alves (*)



As palavras livres voam e pertencem, depois de lidas, a quem as compreende e interpreta. Surge então a figura do leitor, que ao emprestar ao texto suas impressões se torna parte do universo ali descrito.

Escrever é sagrado. Escrever é profano. Escrever é coisa do ser humano. Ato solitário, vontade de se expor, coragem de dizer aquilo que se pensa.

Mesmo quando mente ou inventa, o escritor se expõe. Faz isso de propósito, brinca com as sutilezas do cotidiano enquanto deixa aqui e ali suas angústias, desejos, ironias e frustrações.

O texto jornalístico não permite abstrações, sabemos. A indústria da informação precisa de conteúdo objetivo, direto e sem rodeios. Quando muito se permite ilustrar com personagens e histórias de vida os fatos reportados.

Mas a isenção nunca vai ser total, completa, afinal somos humanos e quando escrevemos geralmente falamos de nossos semelhantes. Nos envolvemos, mas só podemos dar nossa opinião depois do expediente ou na roda do cafezinho.

Isso é muito pouco para quem carrega dentro de si o amor pela Literatura. Esse tipo de jornalista quer mais, não se conforma com esse limite, procura então outros espaços onde possa expressar as imagens e histórias que lhe habitam a alma.

Longe de ser uma válvula de escape o ato de escrever é um ato de resistência. Quando saímos do ramerrão, da fórmula, da produção, enfim, da roda viva que é escrever como quem produz parafusos ou arroz; quando deixamos sobre o papel aquilo que realmente queremos deixar, adquirimos um pouco mais de dignidade.

O Literário é um desses lugares onde o jornalista encontra e descreve o ser humano em toda sua crueza e magnitude; sem restrições ou interferências. É por isso que estamos aqui e é para isso que se presta a nobre arte de encadear palavras. Falar de nós mesmos para nós mesmos sobre aquilo que somos. Não é pouca coisa.

(*) Jornalista

Nenhum comentário: