sexta-feira, 4 de setembro de 2009

A busca ilusória de toda a verdade

Milton Coelho da Graça (*)



O presidente Lula, com notável franqueza, admitiu, em entrevista exclusiva, concedida a Mário Sérgio Conti, da revista piauí, não ler jornais nem revistas, não usar a internet para ler notícias ou blogs nem ver noticiários na televisão.

Merval Pereira dedicou a essa entrevista o comentário de hoje, terça, 06/01, concentrando a análise no óbvio desagrado presidencial em relação ao trabalho da imprensa, considerado “tumultuado e injusto” desde o início do primeiro mandato em 2003.

E critica fortemente a dependência, para o conhecimento claro da realidade no país e no mundo, a que o presidente teria voluntariamente se submetido, em relação a um pequeno grupo de assessores, encarregados de “digerir”, “selecionar” e “comprimir” todo o noticiário que possa lhe interessar.

Merval diagnostica que esses “canais de informação do presidente estão mais para propaganda do que para notícia”. Chega mesmo a apontar essa deformação como causa de erros de avaliação dos efeitos da crise mundial sobre a nossa economia.

E é sobre este ponto que proponho uma outra discussão: será possível a um presidente da República obter hoje uma visão plural de tudo que possa influenciar suas decisões através da leitura atenta dos três ou quatro maiores jornais, pelo menos duas revistas semanais, algumas outras publicações mensais e sem perder pelo
menos os dois mais importantes noticiários da televisão?

A pergunta tem sentido duplo: 1. o presidente da República teria condições de cumprir tudo isso como “tarefas obrigatórias” ?; e 2. mesmo acompanhando com máxima atenção todas essas fontes de informação, ele teria acesso a essa “visão plural”?

Por obrigação profissional, respondo “sim” à primeira pergunta. Mas a vida me ensinou – e certamente também ao presidente Lula - que não dá para repetir o “sim” à segunda.

Não podemos esquecer que dirigentes de outros países e das maiores empresas também são obrigados a delegar a tarefa da “peneira” – quantitativa e seletiva do noticiário – para conseguir um quadro mais ou menos completo e confiável, no qual basear as decisões.

A coluna de Merval é ótima como reflexão e defesa da liberdade de imprensa, mesmo quando imprecisa ou até mentirosa. Mas louco seria o governante que apenas confiasse nela para saber todos os ângulos de visão da realidade.

Dois anúncios de jornais brasileiros buscaram há algum tempo realçar suas maiores qualidades. O Estadão publicou uma mensagem em que proclamava a “credibilidade” como seu principal atributo. A Folha lançou um outro, em que ia apresentando algumas qualidades de um chefe de Estado, ao mesmo tempo em que ia surgindo a foto de Adolf Hitler. E aí afirmava com toda a razão, que, às vezes, não é preciso dizer mentiras, mas apenas não contar TODA a verdade;

Esse é o “x” do problema, como diria Noel Rosa.

(*) Milton Coelho da Graça, 78, jornalista desde 1959. Foi editor-chefe de O Globo e outros jornais (inclusive os clandestinos Notícias Censuradas e Resistência), das revistas Realidade, IstoÉ, 4 Rodas, Placar, Intervalo e deste Comunique-se.

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